Uma decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) poderá incentivar as empresas a substituir a Participação nos Lucros e Resultados (PLR) por planos de previdência complementar.
Recentemente, o tribunal administrativo afastou uma autuação fiscal contra uma das empresas do Grupo André Maggi - dos segmentos de agronegócio, navegação e energia - que optou por pagar para seus funcionários, a título de previdência privada, uma parcela anual calculada com base nos resultados alcançados.
Para especialistas, a decisão confere maior segurança jurídica ao pagamento efetuado por meio de plano de previdência, que tem regras mais simples e, portanto, estaria menos sujeito a autuações do que a PLR. O Fisco tem multado várias companhias que usam a PLR para incentivar seus funcionários a cumprir metas por entender que os valores pagos teriam natureza de remuneração. Assim, deveria incidir a contribuição ao INSS, cuja alíquota é, em geral, de 20% sobre a folha de pagamentos.
De acordo com o plano de previdência utilizado pela Amaggi Exportação e Importação, se for alcançado um determinado resultado no ano, todos recebem. Quem entra na empresa durante o ano, ganha o valor proporcional e quem tem cargo de gestão recebe um adicional calculado com base no resultado individual. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Amaggi informou que não comentará o caso.
O Fisco declarou ilegal o plano da companhia por ele prever, além do pagamento de uma parcela fixa, baseada no salário de cada funcionário, um valor variável, relacionado ao resultado da empresa no período. Questionou o depósito de valores diferentes a cada funcionário, em função dos cargos que ocupam.
E também considerou ilegal a previsão de pagamento de valores menores aos empregados que não possuem ainda um ano na empresa.
A Receita alegou que o procedimento não está de acordo nem com a legislação da PLR (Lei nº 10.101, de 2000) nem com a norma que regulamenta a previdência privada (Lei nº 109, de 2001).
O processo foi julgado pela 1ª Turma da 4ª Câmara da 2ª Seção do Carf que, por maioria de votos, afastou a autuação contra a companhia. Para os conselheiros, a Lei da Previdência Privada só impõe uma condição: que o benefício seja pago a todos os funcionários. E, segundo ressaltaram os integrantes do tribunal administrativo, a Amaggi comprovou que a previdência privada era paga a 100% dos trabalhadores.
Na decisão, o relator, conselheiro Kleber Ferreira de Araújo, declarou que na parcela fixa, havia uma proporcionalidade entre a contribuição da empresa para o plano e o salário do beneficiário, portanto, descabe a conclusão do Fisco de que o plano não teria caráter previdenciário.
De acordo com o advogado Caio Taniguchi Marques, do Aidar SBZ Advogados, ainda são poucas as empresas que fazem planos de previdência complementar desse tipo. É quase uma PLR, mas não precisa de todas as suas formalidades. Não precisa do Aval do sindicato, por exemplo, diz o advogado.
A PLR realmente dá mais margem para autuações fiscais porque há várias outras exigências estabelecidas em lei para garantir a isenção fiscal. Em relação à previdência privada, as regras são mais claras, afirma Raquel Godoy, procuradora da Fazenda Nacional no Carf. Ela afirma que a procuradoria analisa cada caso em particular porque sua legalidade depende de como é ofertado pela empresa.
Se somente a empresa faz o aporte para a previdência privada, ou se a empresa faz o aporte e o funcionário pode resgatá-lo em um curto espaço de tempo, por exemplo, o Fisco pode autuar a empresa, segundo Raquel. De fato, temos decisões favoráveis ao Fisco, por considerar a previdência como Remuneração disfarçada, apenas em casos em que a empresa não ofereceu o benefício a todos os funcionários, diz.
No caso da Amaggi, segundo a procuradora, não foi apresentado recurso porque não há decisão divergente que permita isso. Assim, se não houver entendimento divergente, a decisão será definitiva.
Decisões como essa podem incentivar as companhias a implementar planos de previdência complementar, de acordo com a advogada Maria Inês Murgel, do JCMB Advogados e Consultores. O Fisco não pode olhar para todos os incentivos à previdência privada e entender que são formas de fugir da tributação, diz.
As empresas podem ter encontrado um meio de beneficiar os funcionários com base no resultado da empresa, ou seja, incentivando-os a dar tudo de si no trabalho, usando a previdência privada. E o Carf, com base na decisão relativa à Amaggi, deve aprovar isso, afirma o advogado tributarista Fábio Medeiros, do Machado Associados.
Para isso ser feito da forma mais segura possível, o especialista em previdência privada Sérgio Luiz Akaoui Marcondes, do Zamari e Marcondes Advogados, diz que o plano deve ser oferecido a todos, mas a adesão pode ser opcional. O advogado destaca ainda que é legal cada funcionário ter sua contribuição específica, e que o benefício, por ser suplementar, não integra o contrato de trabalho. Portanto, não há base legal para a cobrança de contribuição previdenciária sobre esses valores, afirma.
Em 2012, segundo a Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi), de R$ 70, 4 bilhões movimentados via previdência privada, R$ 6,4 bilhões corresponderam à previdência privada corporativa. De 2007 a 2011, o valor referente ao que é pago pelas empresas foi crescente. Somente ano passado, houve uma queda de R$ 518 milhões, em relação ao ano anterior.
Fonte: Valor Econômico