A Receita Federal divulgou na véspera instrução normativa para regular a aplicação do Regime Tributário de Transição (RTT), com o objetivo de que as empresas apurem seus resultados sob dois parâmetros distintos: seguindo as regras internacionais e também o padrão contábil brasileiro que vigorava até 2007.
A instrução normativa 1.397 determina que a partir de 2014 as empresas apresentem anualmente a Escrituração Contábil para Fins Fiscais (ECF), que deverá conter todos os lançamentos do período de apuração considerando os critérios contábeis antigos.
No fim de 2007, o governo editou uma lei com o objetivo de migrar as regras e padrões contábeis brasileiros para os adotados em âmbito internacional (IFRS) . Segundo a Receita, esta mudança teria gerado contradições em relação às regras tributárias vigentes.
Para resolver as diferenças, o governo instituiu o RTT em 2009, motivado pela ideia de que os impactos das novas regras contábeis deveriam ser neutros para fins fiscais.
Na prática, o RTT determinava que os impostos federais incidentes sobre receita e lucro fossem calculados com base no modelo antigo, desconsiderando, aos olhos do Fisco, eventuais mudanças trazidas pelas alterações contábeis.
Segundo o advogado tributarista Alessandro Amadeu da Fonseca, do escritório Mattos Filho, o RTT foi idealizado como um regime provisório, que vigoraria por dois anos até que uma nova legislação cuidasse de harmonizar as regras fiscais ao novo padrão contábil.
A nova instrução normativa é uma anomalia na nossa visão, porque ela vai na contramão dessa simplificação, com a manutenção de dois critérios distintos, obrigando os contribuintes a manter paralelamente duas contabilidades completas, uma para atender as regras contábeis e outra para atender o fisco, afirmou.
O que a gente imaginava é que deveria haver uma extinção dessa RTT e a criação de uma nova norma definitiva, para diminuir custos, completou Fonseca.
Em um dos seus artigos mais polêmicos, a instrução estabelece que a isenção de impostos sobre os dividendos vale apenas para os lucros apurados segundo os critérios vigentes até 31 de dezembro de 2007. Com isso, o montante eventualmente excedente passaria a ser tributado.
Como a instrução entrou em vigor na data de publicação, mas é um ato de função interpretativa, disse Fonseca, a Receita Federal pode vir a fazer cobranças retroativas.
De acordo com o advogado, a instrução sugere que os sócios de empresas teriam que segregar a parcela do lucro que receberam a título de dividendos, inclusive nos últimos cinco anos, pelos dois modelos diferentes, para então recolher impostos sobre a diferença positiva.
Além de ilegal, a instrução cria uma obrigação de impossível cumprimento, disse ele. Isso gera muita instabilidade jurídica, mas a gente tem convicção de que não deve prevalecer.
Procurada, a Receita Federal informou que fará coletiva de imprensa sobre o tema nesta tarde, em Brasília. Em nota divulgada ontem, a autoridade afirmou que a medida é fundamental para que a Receita possa verificar se os contribuintes estão apurando corretamente os tributos
Fonte: Reuters Brasil