Um julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deve desestimular o interesse das empresas pelo Refis da Crise, cuja reabertura foi aprovada ontem no Senado. A 1ª Seção da Corte manteve uma decisão de 2011 que autoriza o uso de depósitos judiciais para o pagamento de dívidas inscritas no programa de parcelamento. No entanto, o entendimento não permite que os valores obtidos com a correção desses depósitos pela taxa Selic sejam revertidos para as empresas.
Criado pela Lei nº 11.941, de 2009, o Refis da Crise permitiu o parcelamento de dívidas tributárias em até 180 vezes, com descontos de até 100% sobre as multas e de 45% para os juros por atraso no pagamento. Como há redução de 45% nos juros, a intenção da clínica odontológica Sumikawa, autora do recurso analisado pelos ministros do STJ, era recuperar esse mesmo percentual sobre os juros obtidos com o valor depositado.
A decisão, de acordo com especialistas, afeta especialmente os contribuintes que depositaram os valores dentro do vencimento, ou seja, sem juros ou multa. Essas empresas não têm vantagem alguma em entrar no Refis, diz o advogado Leonardo Augusto Andrade, do escritório Velloza & Girotto Advogados. Para aderir, a empresa teria que desistir da discussão judicial sem ter direito ao desconto dos juros.
Em menos de cinco minutos, os ministros da 1ª Seção da Corte reafirmaram que os juros incidentes sobre os depósitos não pertencem ao contribuinte, mas à União. A Receita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) já impediam o levantamento dos juros, com base na Portaria Conjunta nº 10, de 22 de julho 2009, que regulamentou a Lei do Refis.
O julgamento do recurso (embargos de declaração) da clínica odontológica do Paraná era aguardado há quase dois anos. Na tentativa de mudar a ideia dos ministros, grandes escritórios de advocacia realizaram audiências e entregaram memoriais, como o do jurista Roque Carraza, favorável à tese da reversão dos juros para o contribuinte.
O advogado da empresa estudará levar a discussão para o Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo Daniel Prochalski, há um problema de isonomia entre os contribuintes que depositaram o débito antes do vencimento e aqueles que, por inadimplência e falta de apresentação de garantias, acumularam multas e juros e obtiveram descontos no parcelamento.
Apesar de ser do STJ a responsabilidade pela interpretação de leis de anistia, a tributarista Valdirene Lopes Franhani acredita que há chances de questionar o assunto no Supremo. Está em jogo o direito à propriedade. Até ser convertido em renda, o depósito e os juros são do contribuinte, afirma a sócia do Braga & Moreno Consultores e Advogados. Para Valdirene, a decisão do STJ ainda desencoraja as empresas a fazer depósitos judiciais. Na hora de dividir a conta por meio da anistia, a empresa que foi mais conservadora é prejudicada.
Vitoriosa em relação aos juros, a Fazenda tentava alterar parte da decisão de 2011 que permitiu às empresas usar os próprios depósitos judiciais para quitar as dívidas fiscais por meio do Refis - inclusive nos casos em que a ação judicial já estivesse encerrada (transitada em julgado) a favor do Fisco.
O procurador João Batista de Figueiredo, coordenador-geral de Representação Judicial da Fazenda Nacional, informou que analisará o acórdão para definir se o órgão recorrerá da decisão.
A Medida Provisória nº 615 que, dentre outros pontos, reabre o Refis, não muda as condições do programa. Apenas amplia o prazo de adesão até 31 de dezembro deste ano. Podem ser incluídos débitos vencidos até 30 de novembro de 2008. A MP agora vai para sanção presidencial.
Fonte: Valor Econômico