Setembro não será marcado apenas pelas mudanças nas estações nos hemisférios norte e sul, marcando a chegada do outono e da primavera para os respectivos. O mês também trará diversos eventos que serão cruciais para definir os rumos da política econômica mundial, com reflexos nos mercados acionários e de títulos ao redor do globo.
Conforme destaca em artigo Michael Spence, ganhador do prêmio Nobel de Economia em 2001, o ambiente de incerteza econômica global continua apreensivo. Os problemas econômicos da Europa ainda estão esperando por nós, em setembro, destaca o economista.
Spence faz referências aos dias de verão em Milão, que se torna uma das mais silenciosas das cidades europeias, ao contrário de Paris ou Roma, lugares em que os turistas tomam conta. Contudo, com o fim do verão, as incertezas tomam conta da ordem do dia - mas não somente na Europa.
Protestos em grande parte imprevistos na Turquia e no Brasil têm levantado dúvidas sobre a sustentabilidade econômica e social do crescimento nos mercados emergentes. Os incêndios em fábricas de vestuário de Bangladesh levantaram novas questões sobre a governança das cadeias globais de fornecimento, avalia Spence.
Mohamed El Erian, fundador da Pimco, maior gestora de renda fixa do mundo, também destaca que os próximos meses devem ser particularmente complicados e voláteis para os mercados, com a incerteza que vem dos EUA, Europa, Japão e Oriente Médio.
No mundo desenvolvido, as sinalizações são de que o Federal Reserve irá diminuir o ritmo de sua política de flexibilização monetária, reduzindo o programa de títulos mensais de até US$ 85 bilhões. Isso segue afetando os mercados, em especial os emergentes, com a saída de capitais para estes países. E esta deve ser somente uma prévia da saída bastante complexa do modelo de crescimento assistido que tem prevalecido nos EUA, Europa e Japão, avalia Spence.
Já El Erian reforça que as implicações da diminuição do programa de títulos nos dois mundos - emergentes e desenvolvidos - são bastante diferentes. Em meio à saída cada vez mais iminente do Fed, os mercados exigem sinais mais críveis de perspectivas de crescimento mais forte. Caso contrário, tanto a perspectiva aumenta as chances de desestabilização de capital, aumentando os riscos também de transtornos também na política.
E o nono mês do ano deve trazer um impacto político ainda mais forte, com as decisões sobre o orçamento e o teto da dívida complicando o panorama ainda mais, avalia Spence. Conforme aponta uma pesquisa feita com economistas, uma das principais preocupações frente à economia norte-americana envolvem o tamanho dos déficits entre 2020 e 2030. El Erian ressalta que, no outono norte-americano, o Congresso polarizado nos EUA deve levar a uma forte volatilidade no mercado.
Definição de cenário
Nos próximos meses, as decisões políticas serão reveladas, trazendo efeitos significativos sobre as taxas de crescimento, os preços de ativos e sobre a confiança de consumidores e dos empresários. Para começar, a nova liderança da China afastou a possibilidade de tomar mais medidas de estímulo fiscal e monetário e aceitou uma desaceleração da economia. Os principais sinais virá da reunião plenária do Partido Comunista da China no início do outono.
As reformas da China podem apoiar a mudança econômica, aumentando o sentimento e tornando mais otimistas as previsões de crescimento ou vão decepcionar com a atenção maior na probabilidade de haver maior foco no tamanho e na natureza da intervenção do Estado nos mercados. De qualquer forma, com o futuro do motor principal do crescimento da economia mundial em jogo, os efeitos serão sentidos em todo o mundo, diz Spence.
Enquanto isso, nos EUA, a desalavancagem econômica avançou significativamente, momento este que o país procura se adaptar estruturalmente e gerar o crescimento do PIB real. Neste sentido, está a questão do modelo de crescimento assistido pelo Fed.
Alemanha: eleições ficam em destaque
Considerado o porto seguro da Europa, a Alemanha promete levar a um movimento bastante volátil para as bolsas pelo mundo, em meio às eleições gerais do país, que é visto como um termômetro para o compromisso em continuar no euro.
O programa do BCE (Banco Central Europeu), conhecido como OTM (Outright Monetary Transaction), é um programa de compra de títulos soberanos, embora condicional, parece ter estabilizado os mercados da zona do euro de dívida soberana, ainda que em um ambiente de baixo crescimento. Entretanto, o programa depende do apoio alemão. A questão é quanto tempo isso pode durar, dado o crescimento no sul da Europa e os desafios de emprego, avalia Spence.
Outros cantos da Europa
Na Itália, o centro do debate deveria ficar para os impostos em geral, que seriam decisivos para tornar a economia mais competitiva e dinâmica. Entretanto, conforme aponta Spence, estas mudanças estão longe do foco do mercado: as principais reformas liberalizantes que aumentam a flexibilidade da economia e o ritmo de ajustamento não estão na ordem do dia. Por outro lado, em algum momento, a agenda política tem que mudar para uma verdadeira reforma, diz Spence.
Spence destaca assim que, sem destituir os riscos de deterioração, permanece cautelosamente otimista sobre a economia global, em meio a maior clareza sobre os rumos das economias norteamericana e chinesa, que devem impulsionar suas atividades.
No mesmo cenário europeu, El Erian ressalta que várias iniciativas regionais foram colocadas em banho-maria em meio às eleições alemãs que ocorrerão em setembro, o que reduziu as divergências políticas.
Contudo, a conta virá a partir dos próximos meses, com a agenda bastante sobrecarregada, associado ainda a uma revisão de três programas de resgate particularmente complicados, no Chipre, Grécia e Portugal. Em cada caso, eles precisam encontrar maneiras de aumentar o financiamento e refinanciar a dívida.
Ásia e emergentes: o que esperar até o final do ano?
No Japão, destaca o fundador da Pimco, o grande destaque fica com as expectativas para inaugurar a terceira cartada do programa de estímulos (composto por três flechas), que está bastante atrasada e que mina o cronograma do Banco do Japão para acender a economia do país. A terceira flecha contém os elementos escolhidos pelo governo de Shinzo Abe para gerar estímulos à produção e ao consumo.
Este atraso se reflete ao forte sell-off no mercado japonês, além do comportamento da moeda, o que sinaliza que os políticos japoneses podem falhar caso o estímulo monetário e fiscal não venha acompanhado rapidamente de reformas estruturais.
Em pauta, está ainda os danos considerados desproporcionais causados pela saída de capital aos países emergentes, o que deve reacender ainda mais as tensões na próxima reunião do G-20, que ocorrerá em setembro, na Rússia. Já no início de outubro, o Banco Mundial irá realizar as suas reuniões anuais em Washington.
Depois, há o Oriente Médio, com uma longa lista de incertezas, estas com consequências bastante drásticas e que devem gerar uma forte instabilidade. Enquanto a situação do Egito não é tão terrível quanto da Síria, ele também não tem as âncoras institucionais e políticas necessárias para restaurar a estabilidade rapidamente.
Mês também será crucial para política brasileira
Em meio à queda da popularidade da presidente Dilma Rousseff a partir de junho, com os protestos realizados no final do primeiro semestre, a política brasileira estará mais uma vez em pauta.
O grande receio do Palácio do Planalto é que o crescente pessimismo apontado pelo mercado financeiro internacional e empresas nacionais se prolongue. Dilma acredita que o mês será crucial para a retomada econômica, sendo bastante importante para determinar se a tentativa da presidente se reeleger é viável.
Apesar da melhora dos índices de aprovação de Dilma e do governo, o desenrolar dos acontecimentos econômicos devem ser cruciais para determinar a viabilidade da governante para o próximo mandato. A desaceleração do mercado de trabalho deve contar pontos contra, mas a grande aposta é que as concessões de rodovias, ferrovias, aeroportos, portos e blocos de petróleo devem animar o empresariado.
Fonte: InfoMoney