A volatilidade que tomou conta do mercado brasileiro neste ano deve servir como um teste para o sucesso da adoção das normas internacionais de contabilidade (IFRS) no país, afirmaram especialistas presentes em encontro sobre contabilidade e controladoria realizado ontem pela firma de produtos para gestão contábil SCA Systema em São Paulo. Empresas e auditores devem redobrar o cuidado com a preparação e a revisão das demonstrações financeiras deste ano em meio ao sobe-e-desce de indicadores e as incertezas que rondam a economia. Esse é o primeiro ano de nervosismo exacerbado do mercado sob a vigência do IFRS no país. O padrão internacional passou a vigorar no Brasil em 2008, mas sua adoção só se tornou obrigatória para os balanços referentes a 2010. ?As empresas terão de ter muito cuidado para estabelecer os parâmetros para julgar itens como o valor justo de seus ativos e passivos e realizar eventuais baixas contábeis. Há uma resistência em realizar essas baixas em tempos de resultados menores?, afirmou Bruce Mescher, sócio de auditoria da Deloitte. Nesse contexto, os auditores ressaltam a importância de práticas de julgamento contábeis bem estabelecidas dentro das companhias para que se possa tomar decisões referentes à avaliação de seus ativos e passivos, bem como da situação patrimonial. ?É preciso estabelecer a que instâncias cabem decisões como avaliação das taxas de desconto utilizadas nos modelos. Os preparadores de balanços têm de se perguntar se há um processo estabelecido para isso e se há controle sobre ele?, ressaltou Paul Sutcliffe, sócio da Ernst & Young (EY). Para ele, muitas empresas ainda fazem esse tipo de avaliação ?no olho? e trabalham com contas de chegar, ajustando os modelos para obter o resultado final desejado, sem estabelecer os parâmetros prévios de avaliação que dariam mais fidelidade ao registro contábil. Segundo Amaro Gomes, membro do conselho internacional de normas contábeis (Iasb, na sigla em inglês), a padronização dos julgamentos contábeis dentro das companhias exige uma maior integração entre as áreas de controladoria e as divisões mais operacionais. ?O IFRS foi desenhado para proteger e ampliar a gama de informações financeiras aos investidores e não mirando o gerenciamento das empresas. Mas o aprimoramento de gestão é uma consequência imprescindível?, disse o executivo.
Cuidado extra com regra para hedge A desvalorização do real frente ao dólar e a instabilidade da moeda americana aumentaram o interesse das companhias pela contabilidade de hedge. A adoção da prática que contrapõe dívidas em moeda estrangeira e receitas com exportações pela Petrobras e pela Braskem também aguçou a curiosidade dos empresários. ?Diversos clientes têm nos procurado para entender melhor o modelo e verificar qual a viabilidade de implantação?, disse Bruce Mescher, da sócio da Deloitte. Mas a ?popularidade? da medida exige um tratamento cauteloso. Segundo ele, a contabilidade de hedge exige uma estrutura ampla e eficaz de controles internos e de preparação de documentos para provar a eficácia do método e, que, portanto, não está acessível a todas as companhias. Além disso, é preciso que os auditores fiquem atentos na motivação das companhias em adotar a medida: ?Pode haver uma vantagem momentânea com a redução das perdas financeiras, mas, no longo prazo, a regra é neutra em termos de efeito no lucro. É preciso observar para que a adoção não seja meramente oportunista?. Amaro Gomes, do Iasb, afirma que o dispositivo, cuja adoção é opcional, sempre esteve ao alcance das companhias e não vê empecilhos à sua adoção, desde que haja transparência por parte das empresas em relação à estratégia e o impacto sobre o patrimônio líquido nas notas explicativas. A contabilidade de hedge, cuja adoção é opcional, permite que a correção de parte da dívida em moeda estrangeira pelo câmbio seja diferida no patrimônio líquido e não transite imediatamente pela demonstração de resultados. Na Petrobras, a medida evitou perdas de R$ 7,98 bilhões no segundo trimestre. (NV)
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Fonte: Valor Econômico |