Em 30 anos, prestações mais caras e salário comprometido
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Quem fez um financiamento imobiliário na década de 1980, pelo Plano de Equivalência Salarial (PES), pode ter visto as prestações subirem além do que a renda pode aguentar, nestes 30 anos. A previsão é de que as parcelas fossem corrigidas pela variação salarial acumulada no período, mas muitos contratos saíram do controle dessa proporção. Hoje quem possui um financiamento nessas condições talvez só consiga fazê-lo caber no bolso novamente se recorrer à Justiça.As inconsistências ocorreram porque, em muitos casos, o índice de correção foi o reajuste da categoria profissional do contratante, mas não seu próprio ganho salarial.

Isso aconteceu com o professor aposentado Luiz Boris de Camargo. Quando financiou seu imóvel, a prestação correspondia a 20% de seu salário. Tempos depois, já consumia 40% da renda. “Por causa disso tive de cortar viagens, restaurantes, e foi a minha esposa, com o trabalho de artesanato, que ajudou a manter as finanças”, lembra.

Isso porque, segundo o aposentado, a sua prestação era reajustada de acordo com o funcionalismo público federal, que teve ganhos maiores no período. “Só que eu era funcionário público estadual, e durante muitos anos não tive reajuste, por isso percebi que alguma coisa estava errada”, recorda.

Por essa razão, o aposentado ingressou na Justiça em 2001 e pediu a revisão do contrato de financiamento. Neste ano, recebeu uma decisão favorável: teve direito a receber de volta da instituição financeira responsável pelo financiamento cerca de R$ 40 mil.

O assessor jurídico da Associação dos Mutuários de São Paulo e Adjacências (Amspa), João Bosco Brito da Luz, orienta aos consumidores que estejam vivendo a mesma situação de Camargo para primeiro buscar o diálogo com o banco. “É lamentável essa situação, porque o mutuário acaba sendo lesado e vê sua vida financeira comprometida. O ideal nesse caso é ir à instituição financeira para tentar uma conciliação amigável. Caso não consiga resolver junto ao banco, pode ingressar com um pedido na Justiça”, salienta.

O presidente da Associação Nacional dos Mutuários - Regional Paraná (ANM-PR), Luiz Alberto Copetti, aponta indícios para que os mutuários que financiaram dentro do Plano de Equivalência Salarial observem para buscar irregularidades. Segundo Copetti, um dos pontos a serem avaliados é analisar o quanto a prestação está subindo e o quanto o consumidor teve de aumento salarial no período. Se houver discrepâncias visíveis, é um sinal de que algo pode estar errado.

O especialista em Direito do Consumidor David Camilo lembra que a Lei 8692/93, que regula os financiamentos imobiliários, acentua que a parcela deve levar em consideração a relação entre o valor do encargo e a renda – essa proporção não pode ser maior que 30%. “A empresa não tem direito de fazer alteração se o contratante não teve reajuste na renda bruta. Toda vez que o encargo comprometer a renda da pessoa, a instituição, a pedido do mutuário, deve rever o valor para se adequar a esse percentual”, pondera Camilo.
   
Indícios

Amortização negativa também é sinal de alerta

Outro ponto que precisa ser observado e que pode ser indício de cobranças irregular é a amortização negativa, que acontece quando os juros cobrados na parcela são maiores que o próprio valor da prestação. Com isso, o mutuário sempre paga menos que supostamente devia, o que gera um saldo residual enorme e muitas vezes impagável.

Isso também aconteceu no caso do professor aposentado Luiz Boris de Camargo. Quando terminou de pagar o financiamento de 180 meses, Camargo viu que ainda devia em torno de R$ 10 mil para o banco.

Luiz Alberto Copetti, presidente da ANM-PR, explica que isso acontecia nos financiamentos reajustados pelo PES porque o saldo residual era corrigido pela inflação. “As parcelas tinham correção mínima e quase não havia amortização do saldo residual, que só aumentava. As prestações chegavam a ser irrisórias, mas o saldo devedor era maior que o valor do imóvel”, afirma Copetti.

Jurisprudência

Há decisões superiores sobre o assunto. Um casal de Goiás acionou a Justiça porque a categoria à qual pertenciam teve reajustes, mas eles não. O caso chegou à Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, que considerou que a instituição financeira não pode reajustar as prestações de forma a comprometer a relação entre a prestação e o salário. “É inválida a perícia elaborada exclusivamente com base em informações obtidas junto ao sindicato da categoria profissional em que se enquadra o mutuário, uma vez que é necessária a análise de seus comprovantes de renda”, determinou o relator, desembargador federal Daniel Paes Ribeiro.

 

Fonte: Gazeta do Povo


Data: 30/07/2012 às 03h57
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