Fazenda não pode exigir diferença de taxas de juros
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A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que é ilegal exigir do contribuinte o pagamento de um complemento sobre depósito judicial, quando o valor apresentado corresponder à integralidade do débito tributário em discussão. A decisão é um importante precedente contra prática adotada por alguns Estados, com a redução gradual da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central. Eles cobram a diferença entre o valor do depósito, atualizado normalmente pela Selic, e o montante que seria gerado com a aplicação de taxas mais altas, estabelecidas por leis estaduais para a correção de impostos. Cabe recurso da decisão.

O depósito judicial garante ao Fisco o pagamento do débito tributário em caso de derrota do contribuinte. Na decisão, o ministro relator Benedito Gonçalves entendeu que a apresentação dessa garantia impede que o contribuinte venha a ser surpreendido com a cobrança de qualquer outro ônus financeiro decorrente do atraso no pagamento do débito tributário. O contribuinte é parte ilegítima para responder demanda que busca questionar diferenças de correção monetária sobre depósito judicial por ele realizado, declarou Gonçalves em seu voto, que foi seguido pelos demais ministros. A discussão sobre a correção monetária do depósito deve ser travada diretamente contra a instituição financeira.

Os ministros julgaram um recurso do Estado de Minas Gerais contra a Datamed Instrumentos Científicos e Médicos. A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) quer receber o complemento do valor depositado pela empresa em juízo, corrigido por índice inferior à Selic. Por meio de nota, o órgão informou que o caso está sob análise.

O entendimento favorável ao contribuinte pode ser aplicado em discussões semelhantes e nortear decisões das instâncias inferiores, segundo o advogado Pedro Gomes Miranda e Moreira, do escritório Celso Cordeiro de Almeida e Silva Advogados. O contribuinte cumpriu com a parte dele ao fazer o depósito judicial. Assim, não pode arcar com esse ônus, afirma.

Na Justiça Federal, de acordo com o tributarista Maurício Faro, do escritório BM&A Advogados, não há esse problema. Os depósitos são feitos na Caixa Econômica Federal (CEF) e vão para o Tesouro Nacional, com a aplicação automática da Selic. Na Justiça Estadual, vale o que determina a lei local. Por isso, há quem diga que o Estado deveria cobrar essa diferença do banco, diz.

Segundo Carlos Pelá, diretor setorial tributário da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), somente instituições financeiras públicas recebem depósitos judiciais, e todas aplicam a correção determinada pela legislação. Para o advogado Luiz Roberto Peroba Barbosa, do escritório Pinheiro Neto Advogados, a decisão é correta do ponto de vista técnico porque, se o contribuinte fez o depósito integral, não está em atraso, segundo o Código Tributário Nacional (CTN). Essa diferença de valores não tem nenhuma relação com ele, afirma.

No Ceará, por exemplo, a legislação determina a aplicação do índice da poupança para a correção de depósitos judiciais. Cada Estado tem liberdade para estabelecer um índice de correção de débitos tributários. Esse valor só não pode ultrapassar a Selic, explica o advogado tributarista Júlio de Oliveira, do escritório Machado Associados.

Em São Paulo, por meio da Lei nº 13.918, de 2009, a Fazenda deixou de cobrar a Selic e passou a aplicar juros de mora de 0,10% a 0,13% ao dia sobre débitos tributários. É uma taxa extremamente elevada, que pode chegar a quase 40% ao ano, afirma o advogado Igor Mauler Santiago, do escritório Sacha Calmon e Misabel Derzi Consultores e Advogados. Por isso, o advogado teme que, se o contribuinte perder um processo, a Fazenda passe a cobrar essa diferença entre o valor do depósito, corrigido pela Selic, e o montante que seria gerado com a aplicação do índice instituído pela Lei 13.918. A medida poderá inibir o uso de depósito judicial para garantia de débito fiscal, diz.

Hoje, a Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo (PGE-SP) não faz a cobrança judicial dessa diferença. A informação é do subprocurador-geral do Estado, Eduardo José Fagundes. Se o depósito é integral, ele suspende a exigibilidade do crédito tributário na data em que é depositado. Se não é integral, ele não suspende a exigibilidade. Mas com o levantamento do crédito, fica caracterizado que houve pagamento espontâneo, afirma Fagundes.

Contribuinte mineiro economiza R$ 1,5 milhão

O Estado de Minas Gerais revogou, no início de março, um dispositivo da Resolução nº 2.280, de 1997, que determinava a cobrança mínima de juros de mora de 1% ao mês sobre débitos tributários. A revogação foi feita por meio da Resolução nº 4.404, publicada na edição do Diário Oficial do dia 6. Com a mudança, uma empresa mineira conseguiu, por meio de recurso ao Conselho de Contribuintes do Estado, uma economia de cerca de R$ 1,5 milhão.

Ao julgar o caso, a 1ª Câmara do Conselho de Contribuintes mineiro decidiu que a empresa pode aplicar a Selic sobre os valores em discussão. O caso envolve autuações fiscais referentes a tributos vencidos entre dezembro de 2006 e fevereiro de 2007. Nesse período, a taxa básica de juros nunca foi superior a 0,99% ao mês. Com base na revogação da taxa cobrada pelo Estado, de 1% ao mês, os conselheiros determinaram a aplicação retroativa da Selic.

A Lei Estadual nº 6.765, de 1975, estabelece que Minas Gerais deve usar os mesmos critérios adotados pela União para a correção de débitos tributários. Esse foi um dos argumentos apresentados pelo advogado Leonel Bispo, do escritório Carvalho Machado & Mussy Advogados, que representa a empresa no processo. Com os cortes, a Selic ficou menor que a taxa estabelecida pelo Estado. Portanto, o Fisco não poderia mais cobrar 1%, argumenta. A diferença, de cerca de R$ 1,5 milhão, é considerável.

A disparidade entre os valores é alta porque, segundo a resolução estadual, os juros de mora deveriam incidir tanto sobre a parcela do tributo devido quanto sobre a multa, inclusive a de mora, a partir do primeiro dia do mês subsequente ao do vencimento do débito até a data do efetivo pagamento. Quanto aos tributos vencidos antes da Resolução nº 4.404, o advogado alegou que a revogação do piso de 1% poderia retroagir por ser benéfica ao contribuinte.

 

Fonte: Valor Econômico


Data: 02/04/2012 às 01h16
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